por Lilas Bass
tradução de Cassiana Stephan
Final de junho, contemplo a rua do alto de uma varanda em Lausanne. Criaturas microscópicas que se agitam de uma maneira absurdamente patética em busca de nada além da obediência a uma norma autoritária que exige que coloquemos um pé na frente do outro. Quem andará mais rápido? Saio daqui porque de dentro não entendo nada, o que lhes move me escapa enquanto os observo. Infinitos labirintos de mímicos idênticos que as políticas de natalidade alimentam, uma gata não encontraria ali seus filhotinhos. Quando nos vemos no outro, existimos e, no entanto… E, no entanto, fundir-se ao espelho do idêntico talvez seja se perder, proibir-se a própria singularidade, então o que fazer com as pessoas que não sabem imitar? Do alto da varanda vejo apenas uma massa indistinta que, apesar de estar em simetria, é bastante bonita, embora dificilmente viva, dificilmente viva porque seus gestos são rotineiros, é o cérebro desativado que os executa e se, de um momento para o outro, a rua se deformasse e a mesa explodisse ou se alguém apenas perdesse um braço e começasse a rastejar, todo o mundo ficaria completamente desamparado. É justamente aqui que seria preciso parar para refletir, aqui onde talvez os olhos começariam a ver o outro em sua face degenerada, mas para onde vai o mundo, minha cara senhora? Então, disse para mim mesma: talvez tenha sido neste novo caos internacional que começamos a pensar. Pela via da desordem física e social. Até o momento presente, era bastante anormal ser singular, mesmo que de singularidade em singularidade fizéssemos uma bela pintura com infinitas possibilidades aos nossos pés. E da varanda do apartamento de Lausanne, eu não teria visto a esperada ruela de gestos rotineiros, mas talvez a fabulosa coreografia inventiva e delirante das rodas para andar, dos carros parados, um senhor no telhado que se agita para acolher o vazio, eu teria visto pardais que uivam e pombas transformadas em pavões – talvez eu até mesmo teria visto os mortos voltarem de cabeça para baixo para, assim, comerem as nuvens.
*Imagem: Larissa Schip
Gato, 2016-2017, fotografia em metacrilato, 48,5 X 140 cm